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A importância de Sophia, de Orange is The New Black

Por: em 7 de agosto de 2013

A importância de Sophia, de Orange is The New Black

Por: em

Orange is The New Black, a série mais recente do Netflix, é ótima (leiam as nossas Primeiras Impressões) e uma das razões é o cuidado com os personagens. Como disse no PI, temos uma personagem transexual, o que não é nada comum nas séries. O terceiro episódio conta como a Sophia foi parar na prisão e tocou em assuntos sensíveis: como se referir a uma pessoa trans*, o preconceito da sociedade e como a família reage.

Antes de tudo, uma pequena explicação sobre o que significa o termo “trans*”, retirada do blog Transfeminismo:

“O termo trans pode ser a abreviação de várias palavras que expressam diferentes identidades, como transexual ou transgênero, ou até mesmo travesti.  Por isso, para evitar classificações que correm o risco de serem excludentes, o asterisco é adicionado ao final da palavra transformando o termo trans em um termo guarda-chuva [umbrella term] – um termo englobador que estaria incluindo qualquer identidade trans “embaixo do guarda-chuva”. Daí a ideia do guarda-chuva. Além disso, o termo também pode incluir pessoas trans* que se identificam  dentro e/ou fora do sistema normativo binário de gênero, ou seja, da ideia normativa que temos de “masculino” e “feminino” que forma um binário.”

Na série, temos as outras personagens chamando a Sophia de “he/she” (ele/ela, em tradução livre), tratando-a como se fosse um homem e outras formas pejorativas para falar de uma pessoa trans*. Além de OITNB mostrar que isso é errado, ainda tem a coragem de colocar a Sophia como uma das personagens principais e mais interessantes – algo praticamente inédito na TV –, sem colocá-la como um motivo de piada.

Para mostrar o quanto este fato é importante, traduzo abaixo um artigo da Newsweek sobre a Sophia. Para ler o original, clique aqui.

Sophia em cena

Orange is The New Black, a série original do Netflix que estreou em 11 de julho, não é uma série sobre uma prisão que mais se parece com um catálogo da Victoria’s Secret. Criada por Jenji Kohan (a mente por trás de Weeds), a dramédia retrata com grande sutileza a diversidade dos personagens – prisioneiras, lésbicas, negras, pobres e até WASPs (white, anglo-saxon and protestant – branca, anglo-saxã e protestante, o estereótipo de classe média-alta dos Estados Unidos). E, o mais chocante, uma mulher trans* negra – interpretada por uma mulher trans* negra.

Pela primeira vez na história da TV, uma personagem trans* é um dos destaques do programa e está sendo interpretada por uma mulher trans* negra. Laverne Cox é Sophia Burset, uma ex-bombeira que parou na prisão por usar cartões de crédito roubados dos incêndios que apaga. Na cadeia, ela é a cabeleireira, amiga e consciência política das outras, enquanto tenta ter acesso aos hormônios femininos e consertar o relacionamento com a esposa e o filho. Só outra série teve um papel regular e com consistência na TV feito por uma atriz trans*: Carmelita, de Dirty Sexy Money, interpretada por Candis Cayne, que também fez papéis menores de personagens trans* em Nip/Tuck, Drop Dead Diva, Necessary Roughness e CSI: NY.

“O papel da Sophia é o que eu tenho sonhado, me preparado, treinado para interpretar”, disse Cox, que está atuando há mais de uma década em séries como Law & Order e Bored to Death e em filmes independentes como The Exhibitionists. Nascida no Alabama, Cox entrou na Marymount Manhattan College, em Nova York, no final dos anos 1990 (ela não revela sua idade), onde se assumiu uma pessoa trans* e começou a sua transição. Quase que imediatamente, ela começou a ser escolhida em peças do departamento de teatro, mesmo tendo se formado em dança. Apesar de seu talento, a atuação nunca pareceu um bom plano de carreira. “Eu pensava que não poderia ser uma atriz porque sou trans*”, disse.

Se analisarmos a televisão, o público geralmente encontra pessoas trans* não como atores sérios, mas como uma forma de entretenimento. Era muito comum vê-las em programas sensacionalistas, como o episódio “My Boyfriend Is a Girl” (Meu Namorado é uma Menina) de Jerry Springer Show, de 1997 (e o programa passou muitas variações do episódio ao longo dos anos). Recentemente, porém, os realities-shows modernos começaram a mostrar as pessoas trans* em uma luz diferente. O exemplo mais óbvio é o RuPaul’s Drag Race, mas participantes trans* apareceram no America’s Next Top Model (Isis King) e Dancing With The Stars (Chaz Bono). A própria Cox foi descoberta como participante da primeira temporada de I Want To Work For Diddy, em 2008. Ela transformou essa experiência em seu reality-show TRANSform Me, um reality-show comovente onde Cox e outras duas mulheres trans* fazem make-overs físicas e emocionais em mulheres cis (cis ou cisgênero é o termo usado para se referir a alguém que se identifica com o gênero no qual nasceu).

Ainda hoje, papéis para atores trans* são limitados. O mais comum é serem limitados a apenas uma fala mais ousada, perguntando de um beco escuro se alguém quer sexo, ou morrendo brutalmente na abertura de alguma série policial. Cox é acostumada com esses papéis, tendo feito muitos antes, tão profundamente quanto os scripts problemáticos permitiam.

Sophia tem seus remédios negados

“Como atriz, não é o meu trabalho julgar as personagens”, ela diz, “mas interpretá-las da forma mais multidimensional que eu puder. Sei de muitas mulheres trans* que estão na indústria do sexo e suas histórias merecem ser contadas de uma forma humana. Eu prefiro ver uma pessoa trans* interpretando aquele personagem do que um homem cis em uma peruca”, explica.

Sabendo o que Cox enfrentaria como atriz, a sua primeira professora de teatro, Susan Batson – membro vitálicio do Actor’s Studio – disse a ela que “é o meu trabalho trazer a verdade e algo cru” a esses estereótipos, papéis bidimensionais, lembra Cox. Em outras palavras, ser capaz de atuar – algo que os executivos de canais de televisão e diretores de elenco muitas vezes pensam que pessoas trans* são incapazes de fazer.

“O popular é que os atores trans* não podem ou não são muito profundos”, diz Cox, “porque – e muito disso é culpa de como somos representados – as pessoas pensam que as nossas identidades não são reais. Que somos falsas mulheres”. No GLAAD Awards em um ano, um diretor famoso disse que tudo o que Cox podia fazer era “glamour”.

Essa é a mesma lógica que impede os atores trans* de serem colocados em papéis não-específicos. Nas conversas com diretores de elenco e agentes, disseram várias vezes a Cox que a ideia não ia para frente. (Cox teve papéis que não foram escritos especificamente para pessoas trans*, como a Blithe Stargazer em The Exhibitionists, mas somente porque o diretor do filme a queria naquele papel). Mas o contrário é lugar-comum. Quando personagens trans* de destaque são escritos (o que acontece mais em filmes do que na TV), atores cisgêneros os interpretam – mesmo quando é um filme queer feito por um diretor queer. Desde o filme que deu um Oscar a Hilary Swank, Boys Don’t Cry, dirigido e co-escrito por Kimberly Peirce, a Felicity Huffman como uma mulher trans* em Transamerica, escrito e dirigido por Duncan Tucker, pessoas significativas na comunidade LGBTT têm narrativas transgêneras sem ter pessoas trans* no elenco.

Na televisão atualmente, há um personagem trans* na rede aberta (Unique, de Glee) e um na TV a cabo (Adam Torres, de Degrassi: The Next Generation), ambos interpretados por atores que se identificam como cisgêneros.

Mais ainda, personagens trans* complexos quase sempre são escritos como brancos. “Famíias negras como os Bursets, passando pela transição, com uma mulher e um filho? Eu não lembro de ver visto isso na TV”, diz Cox. “Nunca”.

Claro que o fato de OITNB ser original do Netflix ajuda, podendo fugir do escrutínio da aprovação de anunciantes. E Kohan várias vezes mostrou ser capaz de fazer escolhas complexas.

Mas há sinais de que a indústria como um todo está evoluindo. A atriz trans* Harmony Santana foi indicada ao Independent Spirit Award por Melhor Atriz Coadjuvante por seu papel no filme Gun Hill Road, se tornando a primeira atriz trans* a ser reconhecida por um prêmio de atuação grande nos Estados Unidos. Em novembro, o Sundance Channel deu sinal verde para uma série, T, que o canal descreveu como um “olhar muito pessoal para Terrence, um homem trans* que acabou de passar pela cirurgia de mudança de sexo e está começando a viver como um homem”. Quem interpretará Terrence ainda não foi anunciado, mas há a esperança de que seja um ator trans*.

Ainda assim, escolhas de elenco não importarão se tem um bom material e bons atores. E para que isso aconteça, tem que ter visão e tempo, diz Cox, que é uma otimista.

“Eu acredito na criatividade. Quando os criativos começarem a fazer as coisas, os diretores de elenco vão seguir”, acredita.”


Bianca

Feminista interseccional, rata de biblioteca, ativista, ama filmes, séries, cultura pop e BTS. Twitter sempre vai ser a melhor rede social.

São Paulo - SP

Série Favorita: Grey's Anatomy

Não assiste de jeito nenhum: Lost

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