Ele promoveu um dos mais surpreendentes banhos de sangue da TV e saiu incólume, deixando para trás um rastro de morte e uma pitada de satisfação. Ele recomeçou sua vida com outro nome, outra profissão, e acompanhado por uma das suas mais antigas aliadas – o que não significa que ela esteja confortável com isso, apenas que não tem outra opção. Ele continua brincando com as mentes e os sentidos de todos ao seu redor, inclusive os nossos. Ele nos fez esperar meses por respostas sobre o destino daqueles que acompanhamos por dois anos, e durante um episódio inteiro não deu sequer uma pista sobre eles. Ele fez com que não sentíssemos a menor falta disso. Este é o seu design.
A premiére da terceira temporada de Hannibal foi diferente de tudo aquilo que esperávamos ver. Sem respostas sobre quem vive e quem morre. Sem Will, Alana ou Jack. Apenas Hannibal – agora Boris Jakov. Se lá nos primórdios da série, o personagem-título figurava como um discreto coadjuvante para Will Graham roubar a cena, agora vemos um Dr. Lecter absoluto, capaz de carregar praticamente sozinho um episódio inteiro com tanta maestria que qualquer questionamento sobre os demais personagens se tornou irrelevante.
Hannibal inicia sua passagem pela Europa acompanhado por uma relutante e receosa Bedelia. Há de se convir que todo aquele clima de elegância, grandes festas e alta gastronomia do velho mundo têm muito mais a ver com seu estilo que o dia-a-dia sem glamour como consultor do FBI. Ele levou a sério a máxima de que você é o que você come, e fez de um respeitado acadêmico italiano o seu prato principal, e sua esposa de sobremesa. Depois disso, se apossar do seu lugar no círculo acadêmico de Florença parece ter sido mais fácil que desossar o jantar.
Um dos elementos mais interessantes de Antipasto foi Anthony Dimmond. Cruzar o caminho de Hannibal uma vez é um tremendo azar, cruzar duas vezes e insistir em se aproximar… ainda não tem nome. A série parece ter tentado fazer parecer que ele seria um novo Will na vida do psicopata, especialmente depois de ter sido poupado na primeira noite em que jantaram juntos. Mas Dimmond ultrapassou a linha que separa o instigante do inconveniente cedo demais, e não poderia ter outro destino que não fosse aquela morte assistida por Bedelia. Nunca será.
A psiquiatra, aliás, foi uma presença belíssima – de todas as formas – neste primeiro episódio. No sentido literal, ela e Hannibal tiveram apenas uma cena de dança, mas metaforicamente pode-se dizer que o pas-de-deux se estendeu por todo o episódio. Quantos conhecem a verdadeira face do Dr. Lecter e ainda estão vivos? É claro que há um preço a se pagar. E no caso de Bedelia, é viver em constante tensão, abraçada a uma relação de poder, medo, co-dependência e vulnerabilidade. Ir sempre à mesma loja, estabelecer contato visual com estranhos e sentar-se em frente a uma câmera podem ser tentativas de ser notada de alguma forma. Dar uma pista ou um recado a alguém.
Se no presente Bedelia é a aliada-refém de Hannibal no presente, no passado este posto foi ocupado por um mutilado, porém brilhante Abel Gideon. Tal como no conto de João e Maria, ele é mantido encarcerado, “engordando” – em uma dieFta à base da sua própria carne – até que se torne a refeição perfeita para a bruxa. Gideon nunca esteve tão bem quanto à beira da morte. Definhar parece ter refinado seu senso de humor e sua percepção da vida, dando a ele os melhores diálogos do episódio. Com destaque para a discussão sobre canibalismo, em que Hannibal demonstra que não se enxerga como “um igual” às suas vítimas. Para ele, elas são apenas carne.
É muito bom ter a série de volta à programação semanal. Hannibal foi a minha mais recente paixão da TV e Antipasto mostrou que ela ainda está em sua melhor forma, apresentando muito mais que um produto audiovisual, e sim uma completa experiência sensorial que serve de fundo para um terror psicológico de primeiríssima qualidade.
Algumas observações:
– Muito curioso o flashback do ataque sofrido por Bedelia. Deu a impressão de que a realidade pode ter sido diferente do que ela de fato se lembra.
– Participou ou assistiu?
– Só sei que eu queria assistir e participar das palestras sobre arte do Hannibal <3.
– Também queria jantar na casa dele. Não, pera.
– E o Dimmond se oferecendo pra ser unicórnio da Bedelia e do Hannibal, heim?
– Quem sou eu pra julgar? Acho que faria o mesmo.
O que achou do primeiro episódio? Quais são suas expectativas para a temporada? Deixe seu comentário e até semana que vem!
