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Alphas

Por: em 18 de julho de 2011

Alphas

Por: em

Seres humanos com capacidades sobre humanas vêm alimentando a indústria mainstream de histórias em quadrinhos nos Estados Unidos desde a década de 30, passando por clássicos, como os mutantes X Men, e histórias mais ousadas, como a dos vigilantes de Watchmen. Entretanto, este subgênero da ficção científica não costuma dar bons frutos nas telinhas (excetuando-se, é claro, os cartoons baseados nos já citados quadrinhos), e essa é a ambição do canal SyFy: fazer de uma série superpoderosa um sucesso de público e crítica, chamando a atenção tanto dos já iniciados nerds quanto da audiência convencional, sem negligenciar os exigentes especialistas em televisão. Tentando agradar a gregos, troianos e norte-americanos, a produção acaba não sendo poderosa o suficiente para ser indispensável para algum dos três públicos que pretende atingir.

Alphas, a única série estreante a compor a “Segunda Poderosa” do SyFy (ao lado de Warehouse 13 e Eureka), nasceu de uma conversa entre os criadores Michael Karnow e Zak Penn. Karnow comentou que havia lido sobre vários programas da CIA, do FBI e da KGB que tentaram “recrutar” pessoas com habilidades especiais (físicas e psíquicas) entre as décadas de 50 e 70 – e que a maioria desses programas acabou em desastres completos. “Eu pensei: ‘não seria legal se tivesse dado certo?’“, disse Penn. A série, portanto, é uma mistura de teorias de conspiração e super poderes. Na mistura, temos ainda teorias científicas reais (tanto que as habilidades dos Alphas não são impossíveis, apesar de altamente improváveis), o que é um atrativo a mais para o público alvo do canal (que já exibiu Battlestar, Caprica e Stargate) .

Na série, os Alphas são pessoas com o poder de ampliar habilidades humanas (vê? não são exatamente superpoderes). O neurologista e psiquiatra Lee Rosen lidera uma equipe de Alphas que investiga casos relacionados a outras pessoas com o mesmo fenômeno para o Departamento de Defesa dos EUA. A série explora sua premissa a partir de uma estrutura que mescla a de séries policiais que são sucesso dentre o público norte-americano com quadrinhos que têm a mesma temática. Em seu piloto, Alphas mostrou-se excessivamente formulaica, o que pode funcionar em outros shows, mas aqui é um grande defeito: o fã de ficção científica desta década quer mitologia, quer elaborar teorias, quer uma trama intrincada e repleta de reviravoltas. Os “monstros da semana” não funcionam mais, vide Fringe e Supernatural, séries que só emplacaram de verdade quando passaram a se aprofundar em seus fios condutores. Tudo indica que Alphas siga o exemplo das duas; dedicando-se a sua história sem deixar de apresentar um caso por episódio. A dúvida é se a série será suficientemente interessante para se sustentar apenas com sua mitologia. Vamos aos personagens:

Começando pelos adolescentes, temos Rachel Pirzad (Azita Ghanizada), uma jovem de origem indiana que tem a habilidade de maximizar seus sentidos (apenas um por vez), com a limitação de que, enquanto um “supersentido” está ativado, todos os outros sentidos se “desligam”, e Gari Bell (Ryan Cartwright), um autista funcional que consegue ler ondas eletromagnéticas utilizando o poder de sua mente. A moça é carismática, a atriz é boa, os efeitos que ilustram seus “poderes” funcionam bem e sua habilidade consegue despertar interesse sem ser exagerada. Já Gary é definitivamente o que mais se destaca no grupo: em uma atuação marcante, Ryan Cartwright consegue transpor as compulsões e angústias do personagem de forma precisa, sem dispensar uma certa dose de humor. As cenas de Gary “assistindo TV” e seus episódios ecolálicos são irretocáveis, e seu poder, ainda que um pouco exagerado, é representado visualmente através de efeitos espetaculares.

Pena que os personagens adultos não contribuam tanto para a série: temos o Doutor Lee Rosen (David Strathairn), a indutora Nina Theroux (Laura Mennell), o poderoso Bill Harken (Malik Yoba) e o habilidoso Cameron Hicks (Warren Christie), além do agente Don Wilson (Callum Keith), que supervisiona as missões do grupo. Hicks, que tem a habilidade mais crível do grupo (noções de perspectiva e espaço super apuradas) é também o melhor personagem dentre os adultos. O destaque do episódio foi dele e ele o resultado foi muito bom. A sensual Nina também mostrou-se uma personagem divertida e densa. Enquanto isso, o cientista Rosen, figura paterna do grupo,  é um estereótipo completo, e Bill, o ex-policial estressado que tem habilidades físicas excepcionais ativadas pela adrenalina, falha em carisma, sem que consigamos nos importar com seus dilemas.

O charlatanismo de alguns atores e a utilização de arquétipos muito vistos em produções do tipo atrapalha muito a identificação do telespectador com os personagens. Velho sábio e excêntrico que cultiva plantas medicinais e guarda segredos do passado? Agente federal durão e impaciente? Simplesmente não funciona. Alphas erra a mão na utilização de lugares-comuns, deixando a amarga sensação de que aquilo tudo já foi visto em outras incontáveis tramas. Além disso, os conflitos entre os membros da equipe não convencem e são abordados do jeito errado (“Bill comeu meu lanche de novo“) e a série não consegue despertar uma curiosidade suficientemente forte acerca de seu passado (alguém está doido para saber quem é o grupo Red Flag?): a aura de conspiração que ela tenta criar não amarra o telespectador.

Mas ignorar os diversos acertos do episódio não seria justo. O grupo realmente não tem muita química, mas a utilização combinada das habilidades é muito inteligente. A escolha das mesmas também foi feita com parcimônia: plausíveis e pautadas na ciência e no bom senso, elas permitem que uma atmosfera mais sóbria seja mantida. O ritmo é perfeito, indo do introdutivo ao frenético sem exageros; a direção é habilidosa o suficiente para não meter os pés pelas mãos. As cenas de ação são um espetáculo, com destaque para a luta de Bill e Hicks: coreografada com genialidade e executada sem falhas. Os conceitos científicos que a série apresenta, apesar de claramente exagerados, cumprem seu papel. O caso do episódio não foi excepcional, mas teve bons momentos, como a apresentação de seu ótimo vilão, um indutor com transtorno obcessivo-compulsivo.

Longe de ser um entretenimento acéfalo, Alphas merece reconhecimento por não cometer os mesmos erros que outras séries do gênero, mas em detrimento disso, sua originalidade é comprometida e sua criatividade mostra-se limitada. A série tem medo de ousar demais e acabar não sendo levada a sério, tem medo de apresentar uma mitologia mais densa e perder telespectadores casuais, tem medo de ser completamente episódica e não ser atrativa para os fãs de ficção científica, e o resultado é apático, é uma série carente de uma identidade marcante. Alphas definitivamente ainda não mostrou a que veio, mas o resultado deste piloto acaba por ser positivo: o que a série precisa é abandonar a zona de conforto, deixar os clichês de lado e mostrar-se genuína e excitante.

PS.: Ainda em dúvida quanto a Alphas? Assista aos trailers da série e acesse ao conteúdo do site oficial, que inclusive tem uma área dedicada a descobrir novos Alphas, recolhendo fotos e vídeos que mostrem pessoas exercendo suas habilidades especiais.


João Miguel

Bela Vista do Paraíso - PR

Série Favorita: Arquivo X

Não assiste de jeito nenhum: Reality Shows

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