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T-Dog e o Dia da Consciência Negra

Por: em 20 de novembro de 2012

T-Dog e o Dia da Consciência Negra

Por: em

Alerta: este post tem alguns spoilers da terceira temporada de The Walking Dead e do filme/livro Jogos Vorazes.

Desde que The Walking Dead estreou, houve uma especulação entre os fãs de quando o personagem T-Dog morreria. As apostas não eram as mais longas; como grande parte dos negros em séries e filmes de terror, horror e suspense, eles são os primeiros a morrer, enquanto os protagonistas brancos (e muito frequentemente de olhos claros e loiros) sobrevivem até o fim, mesmo sendo os menos aptos a escaparem dos assassinos.

Para a surpresa de muitos, T-Dog morreu somente na terceira temporada. Ele demorou tanto para sair da série que quando isso aconteceu, houve uma série de imagens homenageando o personagem no Twitter, Facebook e 9Gag. Deixo claro aqui que eu não assisto a The Walking Dead, portanto vou falar do ponto de vista de alguém que só acompanhou por fora o que aconteceu: independente do que o T-Dog fez na série, a impressão mais forte era que o personagem era mais lembrado por ser um negro que sobreviveu por mais do que uma temporada. Ao contrário de outros personagens de TWD, o T-Dog parece que era querido e teve uma morte digna.

Mas por que esta morte em especial causou tantas brincadeiras e homenagens internet afora? Bem, com base nos memes, muita gente ativa nesse nosso mundo cibernético percebeu que ainda existe muito racismo no mundo do entretenimento e, querendo ou não, estão chamando atenção para um fato que parece trivial.

Ao escalar o elenco de um filme ou uma série, os responsáveis pela produção informam qual o tipo de pessoa que querem para determinados papéis. Nos anos recentes, com o crescimento da voz da população negra e latina nos Estados Unidos, os telespectadores e consumidores começaram a exigir mais personagens representantes destas etnias ao invés de termos somente os WASPs (White Anglo-Saxon Protestant, ou branco, anglo-saxão e protestante, que forma o grupo mais poderoso e endinheirado dos Estados Unidos cujo maior representante é justamente a figura icônica do Tio Sam, embora ele não tenha sido criado com este propósito). Para dizerem que estão incluindo as minorias nas produções e retratando a diversidade de pessoas na escolha do elenco, escalaram atores negros e latinos em papéis menores que, em séries e filmes onde personagens vão morrendo, seja por conta de um assassino ou vários, são sempre os primeiros a irem para o saco, embora muitas vezes sejam os mais preparados para enfrentar os vilões.

 

Isso acaba apaziguando um pouco os ativistas e o público, mas por raramente colocarem um negro em papel de destaque (com exceção nos filmes e séries produzidas especificamente para o público afro-americano, que comentei no Dia da Consciência Negra no ano passado), os produtores de Hollywood continuam sendo muito criticados e, por isso, as reações sobre a morte do T-Dog são tão reveladoras.

No começo do ano, o filme Jogos Vorazes (The Hunger Games, no original) foi envolvido em polêmicas racistas por seguir exatamente o que a Suzanne Collins escreveu no livro homônimo. A Rue, uma das personagens mais carismáticas dos livros, teve uma morte trágica – e muito tocante, uma das melhores da série inteira, diga-se de passagem – e os produtores seguiram as instruções da literatura: Rue era uma menina negra e eles escalaram uma negra para o papel (diferente do que aconteceu com a Katniss, que deveria ter uma pele morena e não ser branca como a Jennifer Lawrence é). Quando o filme estreou, muitos racistas não hesitaram em demonstrar todo o seu descontentamento pela personagem não ser alva e teve gente que chegou a dizer que a morte da personagem não foi tão impactante simplesmente porque a menina não tinha a cor da pele que eles tinham imaginado (isso porque a Suzanne deixou claro no livro a descrição dos personagens).

Amandla Stenberg, como Rue, em cena em Jogos Vorazes

Quando a série Girls estreou, além do sucesso enorme e críticas positivas, também foi levantada a questão da Lena Dunham não ter colocado personagens negras entre o quarteto de protagonistas brancas. Afinal, se ela tinha a pretensão de ser “a voz de uma geração”, hoje em dia é incoerente que esta voz seja tão exclusiva e expresse somente o que a elite pensa e sente. Lena justificou dizendo que baseou a série em suas experiências e prometeu ter diversidade de etnias nas próximas temporadas.

Cá entre nós, penso que personagens fora do âmbito WASP têm muito mais a ser explorados justamente por terem uma experiência de vida diferente da maioria dos brancos, que nunca sofreram algum tipo de preconceito por terem uma pele clara. Em Private Practice, mais uma série em que a Shonda Rhimes dá um show na questão de diversidade de personagens, o Sam, um dos melhores cardiologistas norte-americanos, não esquece que ele foi discriminado por ser negro, embora hoje seja da elite econômica.

Estes exemplos já mostram como é importante nós falarmos sobre a questão racial e discriminação que grande parte da população sofre todos os dias, diferentemente do que o Morgan Freeman diz em um vídeo que está circulando por aí. Não é varrendo as coisas para debaixo do tapete que o racismo vai deixar de existir; é necessário debatermos o que está acontecendo, explicar o porquê de ser errado chamar negros de “macacos” e incluir o contexto histórico para tentar reparar as injustiças que os nossos antepassados cometeram contra uma parcela de seres humanos.

E, além disso, não podemos esquecer que os debates sobre o racismo no Brasil e nos Estados Unidos estão em momentos diferentes; lá fora, as etnias estão exigindo o seu direito de serem representados nas produções de entretenimento, porque também são parte integrante da história e cultura daquele país. Aqui, as coisas ainda estão engatinhando e temos vários “programas de humor” e “comediantes” achando que o máximo da criatividade é contar “piadas” preconceituosas e racistas que já eram velhas quando os nossos tataravós eram pequenos.

Para finalizar, uma dos melhores charges explicando muito bem a relação histórica entre brancos e negros (em inglês):


Bianca

Feminista interseccional, rata de biblioteca, ativista, ama filmes, séries, cultura pop e BTS. Twitter sempre vai ser a melhor rede social.

São Paulo - SP

Série Favorita: Grey's Anatomy

Não assiste de jeito nenhum: Lost

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